Comumente, homens gostam de cassinos e mulheres gostam de joalheria. A diferença básica se aplica aos golpistas de gêneros distintos na hora de programarem um assalto grandioso e invisível. Uma vez conquistada a aventura nos cassinos, é chegado o momento das meninas se divertirem com joias avaliadas em US$ 150 milhões de dólares. O diretor e roteirista Gary Ross (Jogos Vorazes) expandiu a família do mafioso Danny Ocean (George Clooney) e seu talento para reunir uma excelente equipe inescrupulosa para trazer à lume a versão girl power da franquia iniciada com 11 Homens e um Segredo, lançada em 2001 e detentora de 2 sequências em 2004 e 2007.
Para essa nova empreitada, o time de 8 atrizes de peso (que reúnem 4 Oscars, 6 Globos de Ouro, 5 Baftas, 10 SAGs, 2 Emmys e 8 Grammys) dão conta com elegância, humor e muita má-fé de um roteiro intrincado que se preocupa em apresentar a vida pregressa de todas as envolvidas na organização criminosa, dando ênfase ao passado de Debbie Ocean (Sandra Bullock), a irmã igualmente vigarista de Danny Ocean, que acabou na cadeia por ter se envolvido emocionalmente com um galã de caráter similar ao seu e de sua família.
Os primeiros minutos de projeção já indicam como as mulheres levam a vida normal. Sandra Bullock mostra toda sua potência cômica por fazer rir com seriedade e calculismo e mesmo que a cartilha dos três primeiros longas seja reprisada com uma certa previsibilidade, ainda assim pega o público desprevenido; afinal, por que se ater a um único golpe, quando a multiplicidade é possível?
Por essa e outras, o filme conta com um ritmo frenético de informações dadas, quase como uma partida de futebol em que lances relevantes ocorrem a todo momento e a menor falta de atenção compromete o entendimento do restante ou de alguma ponta apresentada no fim. A reunião composta pela estilista Rose Weil (Helena Bonham Carter), a contrabandista Tammy (Sarah Paulson), a joalheira Amita (Mindy Kaling), a hacker 9 Ball (Rihanna) e a punguista Constance (Awkwafina) comandadas pela ex-presidiária Debbie e sua melhor amiga, Lou (Cate Blanchett) traz o melhor do humor leve, encarado sem muita veracidade para uma plateia livre de julgamentos baseados no mundo real, e ainda com uma boa dose de ação inteligente e nada pitoresca, com algumas lembranças dos 3 filmes anteriores (para o espectador que acompanhou os longas comandados por George Clooney e Brad Pitt).
Aos cinéfilos mais atentos, vale destacar que a reunião desse time de atrizes é composta por micro encontros de filmes anteriores, tais como as junções pretéritas de Helena Bonham Carter e Anne Heathaway em Alice no País das Maravilhas (2010) e Os Miseráveis (2012), bem como Cate Blanchett e Sarah Pulson em Carol (2015) e também Helena Bonham Carter e Cate Blanchett em Cinderela (2015). Outro encontro curioso é o fato de que os irmãos Ocean contracenaram juntos como a dupla de astronautas encrencados do filme Gravidade (2013).
Uma vez que o protagonismo se divide entre 8 mulheres detentoras de personalidades altamente distintas, o figurino assinado por Sarah Edwards (Tartarugas Ninja) ocupa uma posição relevante na hora de formar a identidade de cada uma. O visual divergente do extenso elenco impede que o público confunda as atribuições de cada uma dentro do esquema criminoso, já que cabelo, maquiagem e vestimenta são os mais variados possíveis e se coadunam em um incrível show à parte.
Note-se que a usuária do colar Toussaint – Anne Heathaway – utiliza uma série de vestidos tomara-que-caia para que o decote e o pescoço tenham uma atenção constante do público durante a preparação para o MET Gala, baile anual que acontece em Nova York, alvo das ladras. Já dentro do evento, o guarda-roupa luxuoso da equipe conta com as mãos de Valentino, Givenchy, Dolce&Gabanna, Prada, Zac Posen, Alberta Ferretti, Naeem Khan e Jonathan Simkhai.
Além de reunir grandes protagonistas, o longa conta com participações que chamam atenção do público. Para o baile do MET, as irmãs Kardashian-Jenner dão o ar da graça ao lado de Katie Holmes, Serena Williams, Adriana Lima, Heidi Klum, Zayn Malik e Zac Posen interpretando eles mesmos. A temida editora-chefe da Vogue Americana, Anna Wintour (mulher que inspirou a eterna Miranda Priestly de O Diabo Veste Prada) e a diretora de eventos da revista, Eaddy Hiernam, participam do filme e o apresentador James Corden também integra o elenco.
Já que o roteiro gira em torno de uma joia Cartier criada pelo próprio Jacques Cartier em 1931, a loja figurou como patrocinadora oficial do longa ao ceder sua Mansion como locação, além de recriar o colar Toussaint e emprestar peças verdadeiras para as filmagens.
Em tempos de #MeToo assolando Hollywood, o fato de o elenco ser puramente feminino suscita a bandeira das causas feministas, que integra o filme com críticas ácidas, pontuais, inteligentes e irreverentes sobre beleza, indústria, multiplicidade de tarefas, concorrência feminina e pressões modernas. Destaque-se que algumas atrizes de 8 Mulheres são ativistas dessas causas em Hollywood e comprometidas com a divulgação dessa militância em seus trabalhos na indústria. Some-se a esse conjunto, a integração de uma atriz indiana, outra asiática e uma negra num momento em que diversidade racial requer urgência de representatividade cinematográfica em longas possuidores de orçamentos milionários.
Com base no exposto, 8 Mulheres e um Segredo é o tipo de filme capaz de reunir temas relevantes mascarados de futilidade feminina e que será, portanto, lembrado por sua relevância no atual cenário social em que o filme se insere. É uma opção ideal tanto para quem pretende curtir uma comédia sem sangue ou excessos cômicos e também a melhor opção da semana para aqueles que gostam de conferir conteúdos críticos que tocam em contextos relevantes do mundo moderno.
O filme está em cartaz no Brasil desde a última quinta-feira, 8 de junho e a bilheteria do fim de semana já o consagrou como um sucesso da temporada. Confira o trailer a seguir:
