Este artigo é resultado de reflexões que tenho feito em torno da forma como o designer gráfico se relaciona como o (s) seu (s) cliente (s), como isso pode ser considerado uma relação de dependência e como em outros casos pode chegar a ferir os valores defendidos pelo designer, como cidadão e pelo meio social em que este está inserido.
“Por décadas a pesquisa [psicológica social] mostrou de forma robusta que as pessoas geralmente valorizam a honestidade, acreditam fortemente em sua própria moralidade e se esforçam para manter uma auto-imagem positiva como indivíduos morais”.
– Francesca Gino
Fui sempre apologista de que era necessário que as formações, principalmente em design também se focassem na ética, nos valores humanos e no respeito mútuo. Costumo fazer uma analogia, que julgo ser justa, entre o designer e o médico; qualquer acção errada de um médico pode comprometer a vida de um paciente, da mesma forma que qualquer acção errada de um designer pode destruir uma nação.
Lembro-me de uma situação em que um estudante de design foi preso por falsificar notas de Metical1. Foi a princípio um choque, um ponto de partida para que começasse a pensar seriamente em questões de ética, de princípios morais na carreira de design. O ponto de partida sobre a ética encontra-se justamente nessa situação, numa situação em que o designer encontra-se “falido” e lhe são propostos trabalhos que no seu ponto de vista não vão de acordo com os seus valores morais. No entanto está necessitado! Em muitos casos engrena, porque precisa de dinheiro para sobreviver.
Existem muitos designers que abandonam a publicidade, essencialmente por causa de seu objectivo e de suas intenções. Que não são essencialmente “maléficas”, entretanto podem ferir com alguns limites de ética que qualquer profissional coloca na sua carreira. Quantas vezes vemos a transformação do corpo feminino como objecto para o sucesso da publicidade? Sabemos que o cigarro é nocivo à saúde, entretanto existe algum profissional por detrás de cada anúncio. Quantos designer concebem embalagens de produtos que fazem mal e mesmo assim continuam? Como contornar isso, se queremos ser remunerados? Até onde vão os nossos valores morais?
Numa relação praticamente de dependência profunda, os designers se entregam até a madrugada a criarem para a satisfação do cliente, existem trabalho que em nada tem a ver com o que acreditamos ser o melhor para o nosso mundo, entramos numa pressão de querer vender e ganhar, estamos numa profunda sede de querer dinheiro e “mandamos lixar” os nossos valores, os valores sociais e culturais construídos durante anos e nos quais profundamente acreditamos. Estamos mais interessados em posts e likes, em passar pela rua e gritarmos que “aquele anúncio é resultado do meu trabalho”. E depois?
Num longo artigo a reflectir sobre a ética, Brian La Rossa2 afirma que “É importante reconhecer que, como resultado de serem mais dependentes de seus clientes, os designers com dificuldades económicas experimentam mais pressão para realizar trabalhos antiéticos do que seus colegas mais abastados. Para ser claro, isso não significa que os designers economicamente desafiados sucumbam a essa pressão com mais frequência; Significa apenas que eles são forçados a suportar mais pressão. Também vale a pena mencionar novamente que os designers podem depender principalmente de seus clientes para prestígio, uma moeda social que tem valor, independentemente do status económico de um designer.”
O facto é que em design, ainda pouco se reflecte em torno da ética. “A cultura do design gráfico não está actualmente estruturada para priorizar e promover a conduta ética”, acrescenta Brian La Rossa.
De acordo com o dicionário Michaellis ética é “Parte da Filosofia que estuda os valores morais e os princípios ideais da conduta humana. É ciência normativa que serve de base à filosofia prática. Conjunto de princípios morais que se devem observar no exercício de uma profissão; deontologia.
Em muitos casos acredita-se que quando se é freelancer, há liberdade. O que pode ser uma ideia longe da realidade. Já que o designer independente também tem custos e necessidades por suprir. O que ele faz quando aparece uma oportunidade? Agarra. É uma clara situação de olhar para as suas necessidades, e enquanto as tiver, os valores morais, os princípios que regem a conduta humana estarão sempre em risco de serem atropelados pela necessidade humana. “A questão principal parece ser: como os designers, podem se tornar menos dependentes de seus empregadores, para que possam criar condições mais favoráveis ??para sustentar carreiras éticas?
Se você é um designer, seu primeiro pensamento ao ler essa pergunta pode ter sido “freelancer”. Uma crença popular na comunidade de design é que “freelancer” é sinónimo de “liberdade”, enquanto “in-house” é sinónimo de “liberdade”. Mas, depois de marcar incontáveis ??horas em ambos os modos de trabalho, eu não usaria as palavras “livre” ou “seguro” para descrever qualquer uma delas.”
Que lugar queremos dar a ética no dia – a – dia da nossa prática profissional? Morremos à fome ou pisamos nos valores morais, que parecem nos dignificar como humanos, como pessoas, como cidadãos. Permanecermos em grandes agências ou simplesmente arriscamos em trabalhar de forma independente a procura de uma tal suposta liberdade? Entre a possibilidade e impossibilidade, vale a pena manter a ética?
1 Unidade de moeda moçambicana.
2 Membro da Medium desde 2017. Director de design da divisão de educação da Scholastic. Escreve ensaios sobre teoria e prática de design para o Design Observer. Leitor voraz.
Consultas:
medium.com
designices.com