Artes O cartaz tipográfico um heróico marginal

O cartaz tipográfico um heróico marginal

Por Ana Procopiak

Desde a efervescente Revolução Industrial que acelerou a produção de bens de consumo, estratégias de comunicação propagavam as vantagens de comprar este ou aquele produto ou serviço. Um dos meios de comunicação utilizados foi o cartaz que podia ser produzido em série e que no contexto urbano das metrópoles do século XIX estava muito próximo das pessoas nas ruas estabelecendo uma comunicação direta.

Os artistas da época que já utilizavam alguns meios de produção de pequenas séries – por meio da gravura em metal e da xilogravura – ficaram extasiados com a possibilidade de se apropriar não só do novo meio de produção em série de imagens em alta escala – a litografia e um pouco mais tarde o off-set – mas também de sua linguagem que começava a pensar modos de atrair o olhar, facilitar a comunicação e motivar o consumo. Muitos artistas viam no cartaz uma das principais expressões dos novos tempos e potente meio de propagação da nova estética da sociedade industrial para um grande número de pessoas, pois por meio dele era possível colocar a arte na rua ao alcance de todos.

De lá para cá muitas águas rolaram em termos das estruturas e composições dos elementos visuais para o que vai se considerar uma boa comunicação dentro do campo das artes gráficas, ou melhor, do design gráfico, passando pelo ideário construtivo moderno que prezava pela clareza e ordem dos elementos, onde o designer teria total controle sobre o processo criativo, e pelo ideário desconstrutivo pós-moderno que incorpora o ruído, o irregular, a desordem onde o designer diante da complexidade e ambigüidade do mundo busca conquistar uma flexibilidade que o permite compreender as múltiplas camadas de relações que permeiam a contemporaneidade.

Dentro da complexidade do meio urbano contemporâneo o cartaz sofre deslocamentos, exclusões, desconstruções, medidas político-administrativas de despoluição visual e proteção ao meio urbano que proíbem sua utilização, ou seja, no espaço urbano ele torna-se um objeto inútil, quase marginal. Pensando na exclusão e deslocamento deste meio de comunicação visual é que o designer gráfico Rico Lins cria alguns de seus cartazes, especialmente o cartaz tipográfico que passa ser alvo de seu interesse quando produz um cartaz para a exposição Brasil em Cartaz, organizada por ele na França em 2005. Segundo ele, cada vez mais o design se articula pelo equilíbrio entre tecnologia, mercado e cultura.

“O conceito criativo do cartaz da exposição “Brasil em cartaz” se resolve a partir de espaços gráficos definidos por essa reflexão: o lambe-lambe, o offset e a serigrafia. Sobreposição de linguagens e momentos tecnológicos que se interpenetram e se contaminam, como de resto fazem nas paredes de nossas cidades”.

Rico Lins, Brasil em Cartaz, 2005

Ele vai buscar na arte as referências para a construção conceitual do cartaz, ao pensar na questão da marginalidade do cartaz e do heroísmo da produção tipográfica em resistir aos meios de produção digital, ele faz uma referencia explícita ao artista carioca Hélio Oiticica que produz nos anos 60 uma obra intitulada Seja Marginal, seja herói em homenagem ao bandido Cara de Cavalo morto pela polícia, levantando questões como invisibilidade, marginalidade e exclusão social.

Hélio Oiticica, Bandeira-poema Seja marginal, seja herói, 1968

Seguindo o mesmo conceito e inspiração ele realiza em 2013 a exposição Marginais Heróis de cartazes tipográficos criados por ele, aprofundando as questões de valor da produção tipográfica. Ele realiza a impressão tipográfica com letras de madeira e chumbo sobre impressões digitais de grande formato sobre retratos de personagens da cultura pop heróis ou marginais, produzindo pela sobreposição de camadas, imagens provocadoras, ambíguas, mambembes e descartáveis já que na maioria das vezes são coladas diretamente na parede. O processo de impressão tipográfica foi realizado na Fidalga uma das últimas tipografias que resistem em São Paulo, numa máquina alemã de 1929.

Rico Lins, Marginais Heróis, 96×66, 2013

“Como pregadores no deserto, os cartazes tipográficos resistem heroicamente em sua marginalidade. Apartados do sistema produtivo, da indústria gráfica, da legislação urbana, do design e da propaganda, eles são pré-cartaz, pré-layout, pré-imagem, pré-tudo. Limitada às letras de madeira, às cores de impressão e ao formato do papel, a mensagem é textual, informativa, garrafal. Se respeitados esses limites, estão ao alcance de quem assim quiser: rápidos, baratos e descartáveis, desafiam teimosa e eficazmente a tecnologia, o mercado, a cultura e a estética de elite”.

Rico Lins, Marginais Heróis, 96×66, 2013

“Deslocados do ambiente urbano e desprovidos de sua função primeira de informação imediata ou comercial, a série de trabalhos que compõe a mostra ao mesmo tempo obedece e subverte alguns procedimentos oriundos da gravura, da pintura, do design, da monotipia. Produzidos em série, cada um é, no entanto, uma peça única onde, apesar do planejamento projetual, o resultado é randômico, empírico, imprevisível. Do ponto de vista técnico, a oposição entre precisão e controle da imagem digital e a rudimentar imprecisão da impressão analógica geram atrito e energia nessa superfície gráfica bidimensional”.

Rico Lins, Marginais Heróis, 96×66, 2013

http://www.ricolins.com/

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