Você já imaginou um sapato feito de um vestido usado, uma saia feminina feita de uma camisa masculina descartada pela indústria ou um colar feito com refugos de madeiras nobres? Não?! Pois hoje, muitos designers buscam em seus projetos. pensar em alternativas criativas e sustentáveis para reaproveitamento do que é descartado pela sociedade de consumo e produção. É o caso dos três estúdios de design envolvidos com moda e processos sustentáveis Insecta Shoes, Comas e Crua.
A indústria têxtil é a segunda mais poluente do mundo e também a segunda maior consumidora de água do planeta e uma das maiores, no que diz respeito ao descarte de produtos e resíduos. Então, é urgente o designer pensar no modo como são projetados e fabricados os produtos de moda, principalmente no seu ciclo de vida. Falar em ciclo vital de um objeto inanimado parece estranho é quase como humanizá-lo, mas fetiches à parte, quando se projeta um produto considera-se quanto tempo este produto irá durar ou ‘viver’, ou em quanto tempo será descartado, o que se tornou cada vez mais acelerado dado que o objeto a consumir torna-se rapidamente obsoleto para manter o ‘moto contínuo’ da produção de massa.
Neste cenário muito se tem falado no upcycling, processo onde literalmente se dá uma ‘subida’ na reciclagem do resíduo ou descarte, ou um ‘up no visual’, mas esta reconfiguração, redesign não é superficial, pois ao procurar evitar o desperdício de materiais ainda úteis, os transforma, sem passar por processos químicos poluidores ou consumidores de água e energia, é uma reciclagem que ressignifica criativamente o objeto descartado, seguindo os passos da natureza onde ‘nada se perde tudo se transforma’, num ciclo de vida do produto onde não há morte ou fim, mas sempre novos começos. Segundo o livro Cradle to Cradle: Remaking the Way we Make Things (2002) do arquiteto William McDonough e do químico Michael Braungart, verdadeiro manifesto do upcycling e do redesign, devemos repensar constantemente modos inteligentes de proteção e conservação do meio ambiente.
INSECTA SHOES
“Transformamos em sapatos peças de roupas usadas, além de garrafas de plástico recicladas. Os mais diversos tecidos e estampas daqueles modelitos abandonados viram botas, oxfords, sandálias e slippers veganos, sem nenhum uso de matéria-prima de origem animal.”
Com um posicionamento de marca bem cuidado a Insecta Shoes produz em Porto Alegre sapatos e acessórios unissex ecológicos e veganos. Toda a matéria-prima utilizada nos sapatos é reciclada no processo de upcycling: borracha triturada do excedente da indústria calçadista, plástico reciclado, reutilização de roupas de brechó, tecido feito com garrafas PET recicladas, algodão reciclado, jeans reciclado. As coleções são pensadas e criadas mensalmente de acordo com o que encontram nas suas garimpagens de tecidos e materiais, não seguindo tendências de moda.
Os editoriais da marca são sempre em forma de manifesto onde aparecem as idéias que guiam os criativos da marca e orientam seus consumidores, como veganismo, consumo consciente, redução de lixo, cuidado com o meio ambiente. A marca trabalha com o ciclo completo de vida de seus produtos, pois propõe aos seus usuários que devolvam seus sapatos à Insecta quando deixarem de utilizá-los, para que novamente possam ser reciclados.
COMAS
“Camisas são peças ícones, de estilo permanente, durável, sem prazo de validade. Essas características acabam se imprimindo nas peças que fazemos, e na política da marca, que vai na contramão da lógica do descartável, das tendências que passam rápido”
A marca Comas idealizada pela designer uruguaia Agustina Comas segue uma ‘máxima’ nas suas criações, a de minimizar o impacto da indústria têxtil sobre o meio ambiente, por isso vem utilizando o upcycling nas suas produções, como afirma a designer “Todos os dias as fábricas descartam produtos que não passam pelos controles de qualidade e muitas peças são deixadas de lado. Pra nós, essa sobra é matéria-prima”. O trabalho começa com uma cuidadosa seleção de camisas masculinas descartadas pelas fábricas, devido algum defeito na fabricação, são identificados os melhores tecidos e a melhor confecção, o desafio segundo Agustina “é selecionar aquelas que têm maior potencial de transformação.”
CRUA
“Através de um olhar atento e sensível busca-se a harmonia de materiais reutilizados ou inusitados com novos elementos, para a construção de produtos de moda e design.”
O estúdio Crua da designer Germana Lopes tem como conceito a ressignificação de materiais, no caso, a reutilização de restos de madeira de marcenarias ou descartadas na rua para o desenvolvimento de acessórios.