A ‘nova’ cara do Brasil no exterior: um resgate do nosso design

A ‘nova’ cara do Brasil no exterior: um resgate do nosso design

Governo federal resgata identidade visual vencedora do concurso nacional de 2005 e reconhecida mundialmente como imagem do país para o turismo.

Por Marcos Tenório

Entra governo e sai governo, vemos a mudança da imagem do nosso país, de uma forma que representa as ideias dos mandatários da república, assim como vemos isso acontecendo em cada estado ou cidade. Tenho diversas críticas a isso pelo fato de que um governo não deve representar suas próprias ideias e sim representar um país inteiro, em suas diferenças e semelhanças.

O papel da marca Brasil, utilizada pela EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo – em eventos no exterior, tem a missão ainda mais clara: representar uma nação inteira, cheia de contrastes que deveria explicar, de uma forma mais simples como somos diversos e, simultaneamente, complementares para pessoas que não nos conhecem.

Mas antes de falar mais da ‘nova’ marca, vou falar da anterior. Durante a gestão de Gilson Machado, na verdade, durante todo o governo Bolsonaro, havia uma necessidade de se desligar de quaisquer símbolos que remetessem aos governos anteriores, a Embratur, seguiu a mesma linha. A marca foi criada pela equipe interna da própria EMBRATUR e utilizada entre 2018 e 2022 tinha problemas sérios de construção, representatividade, tipografia e um slogan, para dizer o mínimo, controverso.

Marca utilizada entre os anos de 2018 e 2022

Inicialmente utilizaram a grafia do país com o Z, em uma tipografia confusa, com um Kerning claramente irregular. Além das escolhas cromáticas que remetem apenas às cores institucionais do governo em questão. Jogando fora o investimento em uma marca de estado, para reforçar uma ideia de governo.

A justificativa do então presidente do órgão era que o novo símbolo (uma versão simplificada da bandeira brasileira) remetia a uma rosa-dos-ventos, “mostrando um país que, em todas as suas direções, é lindo, cheio de cultura e encantamento” (Prefiro não comentar a tal rosa-dos-ventos).

Não bastasse isso, ainda escolhem um slogan com um inglês questionável que abre margem para segundo sentido que pode remeter a um tipo de turismo que não queremos vender: o sexual. Visit and Love US que dizer: Visite e nos ame (como pessoas, como amantes) quando nos referimos a países não são se utiliza o pronome US em inglês, apenas pessoas. A forma correta é: Visit us and love it.

O símbolo, genérico, refletia um nacionalismo, mas de forma genérica. Em qualquer website de ícones ou clipart do pacote office seria possível encontrar algo parecido, até os emojis tinham mais personalidade que esse símbolo. Vale lembrar que, falando em formas, quando se cria algo com um formato de losango, claramente você está mostrando ao leitor algum desequilíbrio. Um símbolo semelhante, inclusive, foi utilizado na Farmácia Popular, com mais equilíbrio e conceito.

Agora voltando à ‘novidade’, com a mudança de governo, a nova equipe decidiu por recuperar a marca anterior. A marca Brasil, criada em 2005 pelo designer Kiko Farkas / Máquina Estúdio e utilizada desde aquele ano, foi vencedora de um concurso lançado pela Embratur e tinha como conceito a BRASILIDADE composta por uma “sinuosidade/curva e transparência, simbolizando a sobreposição de culturas, elemento fundamental na formação da identidade brasileira”, disse o designer na época.

Marca Brasil lançada em 2005, desenvolvida por Kiko Farkas

A marca foi atualizada em 2010, por solicitação do governo para adicionar volume (o que acho desnecessário, já que o jogo de cores dela não precisaria disso, mas isso é uma opinião super pessoal) e refletir às referências visuais da época em que foi solicitada a mudança.

Marca atualizada em 2010 com o aspecto volumétrico.

Com o mote do “É sensacional estar de volta, somos o Brasil com S” a marca volta a representar o conceito criado lá atrás pelo designer original da mistura de culturas e da brasilidade em si, repleta de cores, movimentos e alegria, marcas registradas da nossa cultura diversa. Além disso, a marca tem uma tipografia criada no Brasil, a CURIOSA, desenvolvida pelo escritório Fabio Haag Type / VLF Design Ltda que tem em seu portfólio clientes como Globo, rico.com.vc, Suzano e itaú.

Além disso, as aplicações da marca, assim como a construção das regras de aplicação, tiveram embasamento nas regras de boa legibilidade e composição características do design gráfico profissional. O que faz a marca do país ser reconhecida com mais facilidade nos eventos nos quais participávamos durante o período.

Identidade visual é coisa séria e deve representar um conceito, um propósito, um ideal. Boas marcas duram décadas sem ‘envelhecer’, pois elas são fortalecidas por embasamento durante o seu processo de criação e gestão. Confira o desenvolvimento de uma identidade a um escritório de design garante uma qualidade superior, além de fortalecer a “alma” dessa empresa. Marcas de países, estados ou cidades devem trazer em si elementos que reflitam aspectos culturais da sociedade às quais elas se referem e não devem ser criadas de forma leviana.

Identidade Visual da Cidade do Porto. Studio Eduardo Aires

Um ótimo exemplo de marca de cidade que deveria espelhar os projetos de criação dos designers é a marca da cidade do Porto, em Portugal. Criada pelo Studio Eduardo Aires para refletir suas principais características: os pontos turísticos famosos no mundo inteiro e os grandes exemplos da estética lusitana: os azulejos.

Com ícones inspirados em cada um dos elementos tradicionais da cultura portucalense, traz a pluralidade de uma das cidades mais importantes de Portugal. Suas aplicações conversam com a cidade e parecem vestir de design cada um de seus espaços. Cabe aqui uma observação: essa identidade foi “inspiração” para a identidade atual da Pinacoteca de São Paulo.

Em São Paulo, na década de 1970 foi criado um conjunto identitário que vestiu a Avenida Paulista, desde a criação da marca do metrô de São Paulo atribuída ao escritório de João Carlos Cauduro e Ludovico Martino que pregavam o Design Total, até os totens de sinalização e toda a imagética do local famoso por seus prédios gigantescos e por abrigar um dos mais importantes exemplares da arquitetura modernista: o MASP. Mas, entra governo, sai governo e a ideia inicial foi sendo desvirtuada e o projeto nunca ganhou o tamanho que havia sido pensado no início.

Sinceramente, políticos são viciados em deixar marcas de sua gestão em tudo o que fazem (vide praças verdes ou vermelhas ou azuis) e isso deveria ser considerado crime. Existe em alguns estados uma lei que controla esse tipo de uso de marcas.

Em Pernambuco, por exemplo, é obrigatório que se utilize o brasão da cidade como marca, evitando, assim, as modas de símbolos que todas as cidades acabavam seguindo (lembro de um período no qual todas as cidades tinham símbolos com um monte de bonecos para remeter às pessoas que eles “cuidavam”). Vale salientar que cada marca tem um custo e que nem sempre esse custo é baixo e quem paga somos nós, os contribuintes.

E você? O que achou da “nova marca” da Embratur? Prefere a anterior?

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