Vikings sempre foram lembrados por sua bravura e firmeza com que se portavam diante de seus inimigos, bem como a beleza com que lidava com seus sentimentos e cultura como um todo. E isso é algo claramente notável na história.
O filme “Como Treinar Seu Dragão III” mostra isso de forma divertida e leve, com um enredo rico em ação e diálogos capciosos, temperado com uma produção empolgante e bem desenvolvida.
A ideia de um líder ainda jovem precisando tomar decisões importantes e que refletem na vivência de cada membro de sua comunidade, acaba sendo um fato angustiante em alguns momentos do longa. Sobretudo porque fica difícil aceitar que todo um povo respeite e atenda às decisões de um garoto que ainda encontra insegurança em si mesmo. É angustiante porque são decisões complexas e que direcionam o destino dos personagens, em geral. Não é algo que nos cai bem por conta de nosso senso lógico pautado em nossa própria cultura. Mas logo nos lembramos que na semiótica do filme a questão flui muito bem e dita uma narrativa focada em como aquele povo gerenciava a honra e senso de irmandade entre si.
Em momentos de maior complexidade, o protagonista Suspiro sente que sua insegurança tem mais a ver com a ideia de precisar de seu companheiro dragão do que de si mesmo.
O ideal de convivência entre humanos e feras poderosas acaba sendo uma busca de nosso jovem guerreiro. Isso suscita também a ânsia por morte aos dragões, desejada pelos vilões, que mergulhados em medo pelo desconhecido e o que não compreendem, acabam gerando grandes problemas a nossos heróis. O que nos leva a perceber uma bela lição (além de algumas outras que o projeto aborda e evoca), defendendo a ideia de inclusão e aceitação, unidade, busca de entendimento aquilo que é ainda novo. Em suma, empatia e desenvolvimento das reações universais, pautada em diálogo e respeito. Outra boa lição a se notar é que um herói não precisa ser perfeito para buscar fazer o que é certo e lutar por quem ama. E essa ideia é também apresentada no campo físico, já que o Suspiro usa uma perna mecânica (prótese); o que também reforça a promoção da inclusão (Ammy, minha filha, disse: “Que legal, papai! Ele tem uma perna mecânica!”).
A mensagem mais forte, no entanto, fica para o final do filme, com a ideia gritante e racional, de que o amor liberta. Trazer isso a um mundo em que se promove ciúme e possessão relacional é basicamente frustrar uma boa parte do público. No entanto, o senso comum universal do entendimento que o amor real, puro e simples, liberta e não aprisiona, acaba fazendo todo sentido. E essa lição é evidentemente chocante, mas acha tranquilidade em reencontros mais à frente, na ideia conclusiva, no storytelling da animação.
Esse peso reflexivo é super positivo porque uma animação gráfica sai do limiar de ser apenas atrativa e promover entretenimento vago e passa à um real sentido de tamanha produção e dedicação dos profissionais envolvidos no processo. Por falar em produção e profissionais, o longa não deixa a desejar em questões técnicas.
Dean DeBlois, diretor e roteirista, afirma que esse é o último filme da franquia. E isso talvez explique o fechamento tão decisivo, com Direção de Fotografia de tirar o fôlego (perspectivas, angulação e noção de altura e profundidades espetaculares), trazida pelo Gil Zimmerman, linkada à direção sonora aconchegante, do John Powell.
No geral, é um filme que visa entreter e gera interação à família como um todo e ainda promove o poder da amizade verdadeira, assim como o amor pleno, mostrando personagens super divertidos e inusitados.
O time de dubladores ajuda demais, também. A dublagem original fica por conta de gente como Cate Blanchett, Kit Harington, America Ferrera e Jonah Hill. Na versão dublada (BR) temos vozes de Gustavo Pereira , Luisa Palomanes e o mesmo dublador de “Shrek” e “O Rei Leão”, Mauro Ramos. Um verdadeiro vocal de feras!
E quanto à Direção de Arte, Design, iluminação, movimento, cenário e afins, a DreamWorks e Mad Hatter Entertainment deram show! Paleta de cores tematicamente agradável, bem como leveza e naturalidade nos movimentos, iluminação e equilíbrio de branco bem ajustados, ao passo que as sombras são nítidas e amigáveis. Efeitos especiais muito bem elaborados e texturização super refinados. De uma forma geral, uma produção realmente agradável. E tudo isso para dizer que uma animação gráfica pode ser um filme maravilhoso, que mesmo com falhas básicas – e ao mesmo tempo, contextualizadas, consegue ser uma criação inexplicavelmente agradável e gostosa de se apreciar.
Bem, por hoje é isso. Graça, paz e um copo de suco.