Estreia nesta quinta-feira, 21 de setembro, um dos filmes mais comentados do ano. Detentor das opiniões mais diversificadas possíveis, Mãe! é a nova carta na manga do diretor Darren Aronofsky, elogiado e premiado por Cisne Negro, que volta a tratar do tema suspense psicológico em uma obra multifacetada e peculiar.
Ao público desavisado, a sinopse que resume o filme a um casal com idades diferentes que se isolam em um casarão que havia sido incendiado e passam os dias imersos em seus respectivos afazeres, quais sejam, ela reformando o imóvel e ele buscando inspiração para seu próximo livro, pode pegar muita gente de surpresa. Até certa altura do longa, a história é monotonamente narrada por esse prisma, até que um casal desconhecido bate à porta em busca de abrigo (ele surge à noite e ela na manhã seguinte) e abusam da hospitalidade dos donos da casa. Vale destacar que nenhum dos envolvidos possuem nomes que os identifiquem. Michelle Pfeiffer é a mulher e Ed Harris é o homem que visitam a mansão habitada por Jennifer Lawrence e Javier Bardem. Apenas.
À medida que a inconveniência e excentricidade da hospedagem aumenta, a reação dos anfitriões chama atenção. Jennifer é uma esposa jovem e passiva, enquanto Javier é um homem atencioso que atende a todas as estranhezas de suas visitas de forma incondicional. Nesse ponto, a obra beira ao enfado pela quantidade de vezes que a anfitriã os manda embora sem ser obedecida. A situação só se prolonga e a cada momento, fica mais insustentável. Para o público, surge a percepção de que a casa está viva, pulsante e jorrando sangue.
Depois de uma sucessão de transtornos, o casal se retira de cena e a partir de então, a segunda parte do longa se volta ao misticismo (se é que assim pode ser considerado) que gira em torno da gravidez da protagonista, regado a mais visitas indesejadas, exigindo do público um alto nível de abstração e subjetivismo para conseguir atribuir uma lógica à trama nesse momento. É visível que o diretor estendeu mais do que devia e isso compromete em larga escala o entendimento sobre a mensagem que se pretende passar. Indubitavelmente, é um filme que agradará à poucos e a sua divulgação como uma obra de terror massificada não retrata a realidade da história. Cuida-se essencialmente de um filme de arte e paciência é requisito fundamental para sua fruição.
A arte grotesca retratada na trama fará muitos desistirem de conferir um sentido ao longa. No campo objetivo, tal missão é impraticável, na medida em que o simbolismo que domina a narração e a intenção da obra são intensos. Em que pese a dualidade de opiniões entre os críticos, que se dividem entre aclamarem e rechaçarem a obra (que foi vaiada no Festival de Toronto, mas vem recebendo alguns comentários altamente elogiosos), é quase certo que ao gosto do grande público, Darren Aronofsky não será facilmente digerido ou sequer palatável (as bilheterias estrangeiras já confirmam que o longa teve a pior arrecadação de estreia em um filme protagonizado por Lawrence).
Quanto aos intérpretes, há de se reconhecer que Jennifer Lawrence deu suor e sangue para o papel e o esforço da plateia em entender o longa se ampara na comoção que a atriz é capaz de transmitir diante das situações que lhes são apresentadas. Michelle Pfeiffer tem uma aparição curta, mas suficiente para destilar mistério e impenetrabilidade. Sua personagem enigmática é apenas o prenúncio do que está por vir e ela também é a chave da segunda parte da trama, ao suscitar o quesito maternidade à sua hospedadora. Javier Bardem e Ed Harris são apenas coadjuvantes diante do campo magnético que conecta as duas mulheres.
Ainda que a fotografia do longa possa ser elogiada, um fator técnico capaz de incomodar os espectadores é a interminável sequência de câmeras que andam atrás da protagonista. A filmagem é um pouco trêmula e câmera faz questão de mostrar todas as angulações possíveis a partir da visão de Jennifer Lawrence.
Curiosamente, a história a que o filme se prontifica a narrar é absolvida por cada espectador de forma pessoal. Ao fim da trama, diversas são as referências que se podem comparar e certamente, para uma grande maioria, mensagem nenhuma será identificada. Some-se a esse fato as lacunas que a história deixa ao longo do caminho, que levam sequências que despertam a atenção da plateia a lugar nenhum. Tais fatores contribuem com a bizarrice a que o roteiro se propõe, mas empatam a elucidação completa da história.
(Atenção! Este parágrafo pode conter spoiler). Para quem anda se indagando sobre a temática verdadeira do filme, deve-se antecipar que esta obra é dotada de um teor fortemente místico, religioso e simbólico. A maior parte do público encarou o enredo como uma metáfora do criador, da terra e seus habitantes. A mãe à que alude o título faz referência ao ente que confere vida (à casa ou às pessoas), e o criador é o anfitrião altruísta, idolatrado por uma massa que não sabe lidar com sua bondade e precisa ser perdoada. Os visitantes acima mencionados são apenas os primeiros de uma leva interminável de pessoas incapazes de retribuir a cortesia recebida. O ápice da descortesia metafórica está nos momentos finais da gravidez da esposa. Todo esse enredo corrobora com um panorama maior, que será elucidado nos minutos derradeiros, mas deixará muitos questionamentos para o público, que deixa a sala de cinema entalado com o filme.
Assista ao trailer: