O rebranding é uma ferramenta poderosa no branding e na gestão de marca. Quando bem executado, ele pode revigorar empresas, atrair novos públicos e consolidar um posicionamento estratégico mais competitivo. No entanto, quando feito sem uma base sólida de pesquisa, alinhamento com o público e respeito à identidade da marca, pode gerar impactos negativos profundos, levando à rejeição dos consumidores, à perda de market share e até ao enfraquecimento da marca a longo prazo.
Recentemente, a Jaguar passou por um rebranding que gerou controvérsia entre seus consumidores. O novo posicionamento e identidade visual da marca automotiva receberam duras críticas do público fiel, que não se identificou com a mudança. Esse não é um caso isolado. Empresas em diversos setores, como a Tropicana, GAP e Uber, já enfrentaram desafios semelhantes ao tentar reformular suas marcas sem considerar os impactos emocionais e racionais no público consumidor.
Este artigo explora os riscos de um rebranding mal planejado, com base em conceitos de neurociência de consumo, branding, design, posicionamento e gestão de marca.
A neurociência de consumo e o impacto das mudanças na identidade
A identidade de uma marca está profundamente conectada ao cérebro do consumidor. Quando as pessoas interagem repetidamente com uma marca ao longo dos anos, elas desenvolvem associações emocionais e cognitivas com seus elementos visuais, seu tom de voz e seu posicionamento.
Segundo estudos da neurociência de consumo, marcas estabelecidas ativam áreas do cérebro relacionadas à memória afetiva e ao senso de pertencimento. Quando uma empresa faz uma mudança radical sem preparar seu público para essa transição, ocorre um efeito de dissonância cognitiva, em que o consumidor passa a sentir desconforto com a nova identidade.
A Tropicana, por exemplo, reformulou a identidade visual de seu suco de laranja em 2009, alterando completamente a embalagem. O resultado foi desastroso: os consumidores não reconheciam mais o produto nas prateleiras, gerando uma queda de 20% nas vendas em apenas um mês e forçando a empresa a reverter a mudança. Esse é um exemplo clássico de como ignorar a percepção visual consolidada do público pode prejudicar diretamente as vendas e a reputação da marca.

Reposicionamento Estratégico: Quando a marca perde direcionamento
O rebranding não é apenas uma questão estética; ele envolve a redefinição do posicionamento e do público-alvo. Quando uma empresa altera seu foco sem uma transição bem planejada, pode enfrentar um problema duplo:
- Afasta seu público tradicional, que não se identifica mais com a marca.
- Não consegue atrair um novo público de forma eficaz, pois não construiu autoridade nesse novo segmento.
Foi o que aconteceu com a GAP em 2010, quando decidiu mudar seu icônico logotipo para um design mais moderno e simplificado. A mudança, feita sem uma comunicação clara e sem testes prévios com o público, foi recebida com rejeição massiva. O backlash foi tão forte que a empresa voltou ao logotipo anterior em menos de uma semana.
Esse erro demonstra que mudanças bruscas sem uma narrativa de transição podem ser interpretadas como uma traição aos valores da marca, criando resistência no consumidor.
A Jaguar também enfrentou esse desafio recentemente. Sua reformulação não apenas alterou o logotipo e o design, mas mudou seu tom de voz e público-alvo. A tentativa de se distanciar da imagem de tradição e luxo esportivo para algo mais moderno e minimalista não foi bem recebida pelo público fiel, que sentiu uma desconexão com os valores que sempre associaram à marca.
O perigo da influência pessoal nas decisões de branding
Um dos maiores riscos em um rebranding é quando ele é conduzido por preferências individuais dos executivos ou da equipe criativa, e não por dados e pesquisas sobre o consumidor.
Muitas vezes, profissionais envolvidos no processo querem deixar sua marca em um projeto, mesmo que isso não esteja alinhado com a essência da empresa. Isso pode resultar em mudanças feitas por ego ou portfólio, sem uma real necessidade de mercado.
O caso da Uber em 2016 ilustra bem esse ponto. A empresa abandonou sua identidade visual simples e amplamente reconhecida para adotar um design abstrato e complexo, que confundiu os consumidores. A mudança, impulsionada por decisões internas, foi criticada por ser desnecessária e pouco intuitiva. Três anos depois, a Uber voltou a reformular sua identidade para algo mais próximo do que o público esperava.
A Jaguar, ao reformular sua identidade, parece ter seguido um caminho semelhante. A mudança foi defendida como um passo rumo à modernidade, mas não considerou o impacto da transição no público consolidado.
Persona e Público-Alvo: A importância do alinhamento

No marketing, persona e público-alvo são essenciais para qualquer reposicionamento. Quando uma marca ignora esse fator, pode perder espaço no mercado por não saber para quem está comunicando sua nova identidade.
Marcas como Burberry e Balenciaga já passaram por reposicionamentos de sucesso porque fizeram essa transição de forma gradual e estratégica, garantindo que a nova audiência se conectasse com a mudança. Já empresas como a Pepsi, que alterou drasticamente sua identidade em algumas ocasiões, enfrentaram resistência, pois não respeitaram o vínculo emocional do consumidor com a versão anterior.
A Jaguar, ao mudar seu público-alvo para um perfil diferente sem um processo de adaptação progressiva, arriscou perder sua identidade e seu posicionamento consolidado no setor automotivo de luxo.
Impactos no design e na percepção visual
O design de uma marca não é apenas um elemento estético; ele influencia diretamente a percepção do consumidor. Grandes marcas conseguem evoluir visualmente sem perder elementos-chave de sua identidade.
A BMW, por exemplo, modernizou seu logotipo ao longo dos anos, mas sempre manteve os elementos fundamentais que garantem reconhecimento imediato.
A Jaguar, no entanto, fez uma reformulação radical que eliminou detalhes históricos da marca, tornando sua identidade menos reconhecível e menos conectada ao seu legado. Esse tipo de mudança abrupta pode gerar um distanciamento emocional do consumidor, prejudicando o reconhecimento da marca no mercado.
Como evitar um rebranding mal-sucedido
O rebranding pode ser uma ferramenta valiosa, mas precisa ser conduzido com cautela, pesquisa e planejamento estratégico. Para evitar os erros cometidos por empresas como Jaguar, Tropicana, GAP e Uber, é essencial seguir algumas diretrizes:
- Basear as mudanças em dados e pesquisas – Decisões devem ser guiadas pelo comportamento do consumidor, não por preferências individuais.
- Fazer testes de percepção antes do lançamento – Avaliações com amostras do público ajudam a prever reações e evitar rejeições.
- Equilibrar tradição e inovação – A identidade visual e o posicionamento precisam evoluir sem perder a essência da marca.
- Comunicar a mudança de forma estratégica – O consumidor precisa entender o propósito da transformação.
- Garantir uma transição progressiva – Mudanças abruptas podem gerar resistência e afastar clientes fiéis.
A Jaguar não foi a primeira e nem será a última, a marca agora enfrenta o desafio de reconstruir sua relação com os consumidores e reafirmar seu posicionamento no mercado. Empresas que negligenciam a identidade e a conexão emocional de sua marca correm o risco de perder relevância e enfraquecer seu valor no longo prazo.