Volkswagen, Elis, IA e o mundo Bani!

Volkswagen, Elis, IA e o mundo Bani!

Por Renata Tuccimei

Estamos em 2023, aquela correria, mas no meio do meu feed aparece Elis Regina e Maria Rita, sua filha, juntas cantando em um dueto, dentro de dois carros da Volkswagen…

Tomei um susto e seria ridículo se todos nós não soubéssemos que Elis, falecida a mais de 40 anos, é fruto da inteligência artificial para uma campanha de comemoração da marca de automóveis que está fazendo 70 anos.

A internet parou no último dia 4 de julho, com o vídeo veiculado em todas as mídias do país e temos motivos de sobra para analisar essa repercussão e principalmente, os possíveis resultados para a marca (sim, possíveis, pois ainda é cedo para medir).

O susto

Ver Elis e Maria Rita Juntas foi um choque para muitos, afinal, as cantoras foram separadas pela morte prematura da mãe quando a filha tinha apenas 4 anos. A força que essa imagem tem vem de um imaginário improvável, que se tornou possível através da inteligência artificial gerada pelas ferramentas AutoEncoders e o StyleGan 3, ambas disponíveis no GithHub.

Tecnologia

Quando falamos em inteligência artificial, principalmente para “recriar” pessoas, vem um bocado de discussões:

  • Ética sobre permissão de uso da imagem
  • Os perigos do uso de uma tecnologia deep fake
  • Os desdobramentos dessa mudança na história dos próprios personagens, que não são personagens, mas pessoas reais.

Poderia falar aqui de mil coisas, mas como ainda não há leis bem estruturadas sobre isso, deixo que você use seu senso crítico para julgar.

Os Easter Eggs

O vídeo contém um bocado de referências emblemáticas de relação da Volkswagen com seus usuários. Em um mundo onde tudo é volátil e passageiro, as notícias cada vez mais chocantes e as relações mais individualistas, começamos a nos arrepiar com a música “como nossos pais”, de Belchior, que permeia a peça com um áudio meio que “borrado”, cheio de leves ruídos, dando a entender que é uma versão antiga.

Elis em seu fusca azul, a marcha alterada em resina com flores, hippies em festivais, com a camisa do próprio Belchior, uma Brasília amarela cheia de instrumentos musicais, referenciando as mamonas assassinas de 1995 (me arrepio sem parar enquanto escrevo), a velha lembrança de pais dirigindo com o filho no colo quando não havia rigidez na fiscalização… tantas outras que poderia passar horas aqui comentando… se você quiser ajudar, comenta o que encontrou no vídeo que mais te emocionou, combinado?

Os Haters

Todo mundo quer pegar carona em um buzz (Tunduntz!!!), mas tem aqueles vem para nos fazer refletir ou até mesmo para passar vergonha.

Há quem diga que A presença de Elis foi malfeita, e a meu ver, isso nem sequer manchou a mensagem, que é o mais importante em tudo isso.

Há aqueles que viram uma falta de profundidade, por não trabalhar a trilha de forma política que é sua real interpretação e defesa de Elis enquanto viva.

Há quem traga as questões comerciais da indisponibilidade dos novos modelos para venda, e nesse caso, considero uma SUPER bola fora. Sem capacidade de entrega o objetivo final, a venda, não existe. Porém, se direcionarmos o olhar apenas para o impacto na percepção de marca, sabemos que estão todos abrindo champagne na agência e na diretoria da fábrica.

Teve ainda quem nos alerte sobre a sustentabilidade do velho e do novo ao meio ambiente são ineficazes, já que veículos elétricos também provocam uma alta demanda hidrelétrica.

Todo esse movimento gerou uma repercussão e chegou até o CONAR, que abriu representação ética contra a propaganda e agora, já sinto um gostinho amargo na garganta da diretoria

A narrativa

Um rito de passagem, foi o que me pareceu. Não bastava aquele comercial incrível da despedida do fusca, A AlmapBBDO mais uma vez emociona em uma narrativa que envolve evolução, agradecendo por toda a jornada, trazendo memórias afetivas e easter eggs.

“É você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem” é um discurso perfeito para evocar a mudança para os novos modelos elétricos do fabricante, os ID.Buzz, ID.4, e T-Cross, quebrando objeções aos fanáticos pelos modelos antigos, trazendo a confiança passada de mãe para filha quando Elis dirige a kombi e Maria rita o ID.Buzz. É sobre ser “como nossos pais” e continuar escolhendo a marca.

O novo veio de novo, é a tagline do fim do vídeo, e com ela a certeza que o novo sempre vem pelas mãos da marca, que fortalece essa identidade com o mercado de tradição com inovação, tão difícil de construir, por ser exatamente uma contradição.

Mas no meu olhar profissional, não há mais como posicionar uma marca tradicional sem conversar com a inovação, que é parte dessa nossa vivência atual, onde tudo muda o tempo todo, já diria Lulu Santos, mas esse mote, já daria um novo comercial da volks, concorda? ;)

A marca vem perdendo força para novas concorrentes e não se percebe um movimento de reposicionamento, muito pelo contrário. No quesito branding a Volkswagen mantem uma constância que é consolidada em momentos estratégicos brilhantemente eternizados em campanhas como essa. E quais são os ganhos?

  • Reforço do posicionamento gerado por uma memória afetiva intangível, porem inestimável.
  • Aumento da procura por veículos elétricos, seus pontos de carregamento, tecnologias de suporte, movimentando esse mercado
  • Aumento da procura por veículos antigos, que agora raros, tem valor afetivo e comercial, gerando alto valor para a marca.
  • Redução do custo de aquisição, se pensarmos que apenas uma campanha, sem nenhuma necessidade de ativações e desdobramentos são necessários.

Só há algo que a marca esqueceu e pode causar grandes problemas para todos os envolvidos:
Quando usamos o branding como estratégia de comunicação e marketing, muitas vezes não atentamos para questões além desse âmbito do negócio, deixando arestas soltas e falhas em pontos importantes como experiência do cliente, ética e compromisso social, até mesmo capacidade de entrega, que vão igualmente impactar negativamente e, no fim das contas, para o público que consome, ser fatal.


Como “audiência”, eles me pegaram de jeito, já que eu, fã de Maria Rita desde que começou a cantar, e minha mãe, fã de carteirinha da Elis, nos envolvemos em suas histórias e temos juntas uma música tema cantada por Maria Rita para sua mãe, “Menina da Lua”, a qual tocou no sepultamento da minha.

E por que tô contando isso para vocês? Porque é isso que esse tipo de “comfort marketing” provoca: uma identificação tão forte que supera qualquer outra questão funcional, política e ética de uma ação. Porque eles sabem que a paixão é sempre o que move as marcas.

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