Sustentabilidade: antropocentrismo VS biocentrismo

Sustentabilidade: antropocentrismo VS biocentrismo

Por Ciro Leimig

Eu nutro a seguinte hipótese, difícil de ser verificada na prática mas saudável de ser levantada: talvez não haja pensamento sustentável, aplicabilidade eficiente do ESG ou mesmo um convívio harmônico entre nós e as demais formas de vida da Terra, se não largarmos mão do tal antropocentrismo. Até a forma como referimo-nos a nós, como ‘humanos’, o que também é um adjetivo que nos qualifica, sugere que os outros não o são… Profundo, né? Eu sei. Quase todas as nossas vertentes culturais, filosóficas e religiosas nos levam para um lugar onde nos vemos como especiais, sustentando ideologicamente as nossas ações quase sempre agressivas para com a vida na Terra. Por isso peço paciência e licença para pensarmos a respeito de mãos dadas com a biologia, da qual somos simplesmente parte.

O planeta Terra abriga a vida há mais de dois bilhões de anos. Nós cumprimos uma fração ínfima da presença da vida por aqui. Ao longo desse tempo pelo menos cinco grandes extinções planetárias aconteceram. Todas, claro, antes de nós. A última e mais famosa proporcionou que a nossa evolução (dos mamíferos de modo geral e consequentemente dos primatas) fosse possível: a Grande Extinção do Cretáceo, causada pelo impacto de um asteroide há cerca de 65,5 milhões de anos e que eliminou quase 75% das espécies do planeta… Foi quando os Dinossauros deram tchau após “dominarem” o planeta por centenas de milhares de anos, cerca de 550 vezes mais tempo do que nós. E certamente eles também viveram cada dia como se fosse o último, até que o ‘último dia’ de fato chegou…

“Dominaram”. As aspas têm um motivo simples: não era os dinos que dominavam a Terra no passado. Nem somos nós hoje. Vide o poema concreto que ilustra a capa deste artigo, de minha autoria, que representa uma Placa de Petri qualquer onde seres microscópicos como os Tardígrados (ursos d’água) podem ser vistos vivendo suas vidas. Os Tardígrados são animais excepcionais, resistentes, que ocupam quase toda a superfície do planeta. Alguns estão agora nas plantinhas da sua varanda e são uma espécie que conseguiu sobreviver a todas as cinco grandes extinções da Terra… Todas! E é nessas aspas que reside o engano que sustenta a minha tese!

Os princípios do ESG envolvem sustentabilidade e impacto climático, fatores sociais, como equidade e responsabilidade social, e fatores de governança, como integridade e transparência nas práticas empresariais. Esses princípios buscam promover a ética na nossa relação com o ambiente e indivíduos… Mas não todos. Na prática, pensamos em ESG considerando apenas os indivíduos ditos humanos. Me diga: se numa ponta está o planeta, que jamais será exclusivamente nosso, e na outra está a certeza de que o nosso modelo de vida é insustentável neste planeta, é prudente pensar que estabeleceremos uma boa relação com ele sem que façamos o mesmo com os demais terráqueos? Na minha opinião, se existe, esse é o caminho mais difícil… E nesse jogo não me parece que temos continue ou tempo para jogar no hard!

Diante de um futuro potencialmente cataclísmico, parece que falta uma peça importante para estabelecermos uma boa relação com a Terra: respeitar as suas demais crias! Sim, o respeito é demanda inegociável de qualquer relação entre indivíduos e em algum momento nós nos convencemos de que não é necessário respeitar outros seres… As revoluções humanas nos permitiram crescer à parte da selva, subimos muros físicos e ideológicos que romperam a nossa relação de paridade com os demais terráqueos e, numa ideia egoísta de progresso, reduzimos suas existências a bens de consumo, fazendo o que nenhum predador jamais fez com nenhuma presa: sequestramos seus espaços, recursos, liberdade e dignidade. Para além do sofrimento causado, sobreviveremos mantendo tais muros? Enganação. E você lembra que já cometemos erros insustentáveis semelhantes, hoje vistos como crime, com nós mesmos?  

Todos os dias notícias de inundações, queimadas e secas populam as timelines e parece que estamos lutando contra algo maior do que nós mesmos. Muito mais do que mudar de atitude, talvez essa seja a sensação de quem precisa mudar de ideia! Sem as vidas do planeta no centro, assegurando uma ética planetária interespecífica, talvez não sobrevivamos à sexta extinção.  

E caso você não saiba, no melhor estilo dinossauro life style, já estamos vivendo a ‘Grande Extinção do Antropoceno’, causada pela desestabilização climática por ação humana… Sim, está acontecendo agora e, até onde sabemos, é a primeira vez que uma espécie é a causadora de uma extinção planetária… Enquanto imaginamos um ESG sem mudarmos a forma de pensar, da segurança efêmera dos nossos lares, com nossos gadgets, bifes e motores movidos a combustível fóssil, estamos promovendo (não só) o nosso fim…

Mas tem alguém que não está nem aí: os Tardígrados. Se não mudarmos drasticamente a forma de pensar, nós passaremos. Eles não!

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